Uma alegria selvagem: a vida de Santos-Dumont

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Parece incrível que uma personalidade tão fascinante quanto a do Pai da Aviação não tivesse ainda merecido biografia para o público jovem, não apenas por tratar-se de um grande brasileiro, mas porque seu trabalho sobre a dirigibilidade dos balões e do voo do mais-pesado-que-o-ar levou a humanidade a um dos maiores e mais importantes avanços científicos do século XX.

Além do tema tão importante, o livro chama a atenção pela beleza do projeto gráfico de Silvia Negreiros, com alegre variação de cores do papel  de ótima textura. As ilustrações coloridas de Graça Lima são de grande qualidade e extremo bom gosto: verdadeiros quadros centralizados na folha de abertura de cada capítulo e pequenas vinhetas, em bico de pena, espalhadas pelo texto. Mas um detalhe é especialmente significativo: desde o início da narrativa surge na margem um balão que sobe milimetricamente pelas páginas até alcançar o topo, ao final do livro. É o resumo da vida e da luta de um grande homem que abriu o caminho do espaço para a humanidade.

A editora Manati tem-se dedicado especialmente à literatura para crianças e jovens e alguns de seus títulos foram premiados pelo cuidado com que aliam bons textos ao tratamento gráfico elaborado. Uma alegria selvagem: a vida de Santos-Dumont, de Bia Hetzel, é mais uma afirmação desse duplo conceito. (Laura Sandroni)

 

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Este livro apresenta a biografia de Santos-Dumont mostrando diversos aspectos da sua rica personalidade. A autora se baseou em uma pesquisa histórica cuidadosa sobre o tema. Sem confundir ficção histórica com biografia, ela mostra fatos surpreendentes e pouco conhecidos sobre a vida do biografado. Nascido em 1873, membro de uma família muito rica, proprietária de diversas fazendas na região de Ribeirão Preto, em São Paulo, o pai de Santos-Dumont era francês. Por isso, desde a infância ele terá dupla cidadania. Desde menino, Paris era sua segunda cidade após o Rio de Janeiro. Começou a estudar Mecânica ainda adolescente, observando e consertando as máquinas que beneficiavam café, nas fazendas da família. Quando seu pai adoeceu, todos se mudaram para Paris, para que o patriarca pudesse se tratar com os melhores especialistas da época. Na capital francesa, Alberto visitou junto com seu pai uma exposição de máquinas no Palácio das Indústrias. Esse fato mudará sua vida. Alguns anos depois, ele ganhará sua emancipação jurídica e uma quantia em dinheiro suficiente para sustentá-lo para o resto da vida. Assim ele poderá se dedicar a seus estudos prediletos. Será aluno dos melhores professores e pesquisadores de Física, Engenharia e Mecânica. Sua dedicação à pesquisa não o impede de participar da fervilhante vida social parisiense: amigo de Toulouse-Lautrec, do joalheiro Louis Cartier e do príncipe Rolande Bonaparte, Santos-Dumont era considerado um membro da  alta sociedade francesa. Será ele o organizador da primeira corrida de carros da França e um dos fundadores do Aeroclube da França. Suas primeiras experiências aéreas foram realizadas com seu colega inventor Lachambre, a quem Santos-Dumont se ofereceu como piloto de provas.

O livro apresenta uma bela descrição do que foi seu primeiro voo em um balão esférico: “correndo junto com o ar, a sensação que se tem é de estar imóvel. Pode-se jurar que não é o balão que se afasta, mas sim a terra.” O leitor também saberá que Santos-Dumont construiu diversos aparelhos até alcançar a perfeição do 14-Bis. Este é um aspecto interessante da obra, pois fica evidenciado que as grandes invenções científicas necessitam de esforço e persistência por parte do inventor. Uma das ideias que Santos-Dumont defendia é que os erros faziam parte de qualquer experiência. Sempre contando com o apoio do Aeroclube francês, construirá uma série de dirigíveis, com motores cada vez mais potentes. O leitor também apreciará certos fatos prosaicos da sua vida. Por exemplo: certa vez, Santos-Dumont teve que fazer uma aterrissagem forçada nos jardins do palácio dos Rotschild, uma das famílias mais ricas da França. Em outra ocasião, quando estava fazendo os primeiros testes com o 14-Bis, para melhorar a estabilidade do aparelho, Santos-Dumont colocou um jumento puxando o aeroplano até a nave ganhar altura e subir ao céu. O 14-Bis foi o primeiro voo do mundo mais pesado do que o ar. Os parisienses aclamaram o brasileiro em 23 de outubro de 1906 nos Campos de Bagatelle. Desse modo, o grande inventor ganhou o Prêmio da Aviação oferecido pelo próprio presidente da república. Outro aspecto interessante do livro é que em certos trechos, a autora apresenta passagens do diário de Santos-Dumont. Há apenas uma ressalva nesta obra: algumas descrições a respeito dos aparelhos seriam mais esclarecedoras se viessem acompanhadas por algum desenho. Por exemplo: “Alberto entalhou as lâminas triangulares com outras de alumínio para fazer a hélice do 14-Bis. E para reforçar as extremidades usou cordas de piano ao invés de fibra vegetal. Os desenhos de Graça Lima, apesar de serem bonitos e delicados, são muito pequenos. Descrições como esta apresentada acima necessitam de ilustrações maiores e mais detalhadas. A autora também é sensível para descrever os últimos anos de vida do grande inventor, quando este começou a padecer de uma grave doença neurológica. Há uma frase que Santos-Dumont costumava dizer durante as suas decolagens: “Larguem tudo, que eu vou subir!”. De certa forma, ela sintetiza de maneira marcante o que foi sua vida. Livro imperdível para adolescentes com domínio de leitura, jovens e adultos. (A. C. / Bibliografia Brasileira de Literatura Infantil e Juvenil, v. 14, 2003)

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